quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

The Big Trail (1930) de Raoul Walsh



Para muitos, a obra-prima máxima de Walsh. Para alguns, um dos melhores filmes de sempre. "The Big Trail" ganhou nova vida recentemente (saído em Blu-ray/DVD em 2012, numa edição "de cinemateca", absolutamente imprescindível) com um restauro histórico, que repôs o filme no seu formato original: o "grandeur", em 70mm, criado por William Fox no sentido de formar um novo standard na fruição cinematográfica. A pontaria de Fox foi ter lançado este monumental filme, cujo formato obrigava a uma autêntica revolução tecnológica em todas as salas de projecção que o quisessem mostrar na sua versão original, no ano em que os Estados Unidos abriam falência: a Grande Depressão terá então ditado que o filme mais ambicioso da Fox em muito tempo, eventualmente a maior produção de Raoul Walsh, onde Big Duke surgiu no ecrã pela primeira vez como... John Wayne caísse no limbo dos clássicos esquecidos.

Essa é, em parte, a sina de um cineasta como Walsh, hoje muito menos popular - mas não menos amado - que um Ford. Contudo, Walsh é dos raros cineasta que, graças à sua longevidade (morreu com 93 anos!), percorreu grande parte da história do cinema, de Griffith à eclosão dos novos cinemas. Apesar disso, devido talvez à pouca fixação num género e, quiçá, a todos estes contratempos conjunturais, como o de se lançar na "produção de uma vida" quando o país se definhava por dentro, para hoje falarmos de Walsh  temos de descer vários degraus na escadaria da popularidade encimada por um Ford ou até por um Hawks.

O que nos diz "The Big Trail" do seu cinema? O formato largo, mais de vinte anos antes do Scope, empresta ao filme a dimensão justa do seu particular olho fílmico. Walsh, como Ford, é um realizador espraiado no espaço, com um sensibilidade apurada para a acção e para o drama, com uma predilecção por narrativas viris sobre homens condenados a percorrer, física ou existencialmente, longos percursos com vista a se fixarem algures - o típico settle down americano? Não há metáfora aqui, no caso de "The Big Trail",  já que fala da conquista do território americano pelos primeiros colonizadores brancos (settlers), partindo (à Griffith) de uma história de amor que se desenvolve ao longo de uma travessia épica que suspira por uma ideia de destino. É no sentido dessa fixação que a personagem de John Wayne se move nas paisagens mais agrestes, filmadas in loco fazendo uso de cada centímetro da imagem que parece esticar até ao infinito, superabundando em detalhes o olho do espectador mais destreinado. De novo, a escola Griffith está no sangue de Walsh. O próprio discurso arrebatado de Wayne, numa altura em que a expedição parece sucumbir às dificuldades meteorológicas e geográficas, remete para a ideia de uma nação em construção, em nascimento, que se elevou às custas da resistência do settler mais anónimo. Também aqui se equivalem o todo (a nação) e a célula (a criação de uma família como o grande "móbil" que fez mover multidões pelo espaço).

Mas, mais que o subtexto patriota (mas não patrioteiro), "The Big Trail" é uma experiência estética de uma potência plástica sem par. É raro encontrar uma superprodução desta magnitude - e, caros amigos, não há aqui truques de CGI, tudo aqui "aconteceu" de facto! - e com uma qualidade fotográfica tal que me leva a especular se "The Big Trail" não seria hoje o correspondente a um "O Canto dos Pássaros" de Albert Serra : cinema da e pela paisagem, cinema que busca na matéria da imagem a razão de ser primordial da sua narrativa. Por sinal, num dos extras da edição Blu-ray, um dos comentadores - não sei se era Tag Gallagher - referia-se a "The Big Trail" como um grande filme experimental (ou terá sido um "filme experimental em grande"?). Eu sei que se referia ao pioneirismo (termo útil aqui) no uso do formato "grandeur", mas eu atrevia-me a alongar mais essa conclusão e olhar de novo para o clássico "The Big Trail" como o cume, muito à frente do seu tempo, do "experimentalismo" moderno.

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